Meduras e maquias, é tudo muito bonito mas…

Marta Ribeiro do blogue Quimaterapia já nos habituou aos seus textos sobre a vida no campo mas a sério. Não é só passarinhos e o orvalho da manhã e as borboletas e tal. A terra pede atenções e cuidados permanentes. Por isso não dá para ficar só a respirar o ar puro. 

De todos os trabalhos no campo, apanhar azeitona e vindimar são os que mais gosto (leia-se os que menos desgosto). Ao contrário de outros como a apanha dos figos, do tomate ou de pimentos, só se passa uma vez no mesmo sítio. Podemos ir fazendo a contagem decrescente, cada oliveira apanhada é menos uma oliveira por apanhar. Cada parreira vindimada é menos uma parreira por vindimar. Consegue-se ver o fim da tarefa. Enquanto nos ditos figos, tomates e pimentos se tem que voltar quase semanalmente, uma vez que não amadurecem todos ao mesmo tempo. É que, como diria o Ricardo Araújo Pereira, numa expressão que certamente roubou ao meu pai, é tudo muito bonito mas...

Sabe muito bem estar no campo, sentir o cheirinho do orvalho pela manhã, ouvir os passarinhos a chilrear, seguir o voo das borboletas de flor em flor, aquecer o corpo e a alma quando um raio de sol rompe uma nuvem, mas quando há tarefas a cumprir e tempo limitado para as cumprir não dá para usufruir do cenário campestre. E a apanha da azeitona é um desses casos em que o tempo faz toda a diferença para a qualidade do produto final - o azeite.

O método é simples mas extenuante, cobre-se o chão um pouco além da medida da copa da árvore com um pano de nylon, sobe-se à árvore para varejar (com uma vara de eucalipto ou de bambu) os ramos mais altos, depois, já no chão varejam-se os ramos mais baixos. No pano ficam as azeitonas, muitas folhas e alguns ramos mais frágeis que se quebraram com a vara. As folhas serão mais tarde sopradas no lagar, mas os ramos têm que ser retirados, só depois se pode despejar o produto da oliveira em sacos ou caixas e repetir o processo na árvore seguinte.

Depois da apanha, a azeitona deve seguir para o lagar para ser transformada com a maior brevidade possível, nunca mais de 24 horas, para evitar a fermentação, daí a urgência na apanha. Quando queremos ter a certeza que o azeite que trazemos do lagar foi feito com as nossas azeitonas temos que assegurar que entregamos o suficiente para fazer uma "medura" - não vale a pena procurar o significado desta palavra no dicionário, já o fiz para vos tentar explicar correctamente, mas simplesmente não existe embora se utilize em todo o Ribatejo para denominar uma quantia de azeitona não inferior a 500 quilogramas. O lagar retira uma maquia (uma porção do azeite que serve de remuneração do seu trabalho) e o restante ouro líquido segue para casa, normalmente numa proporção de entre 10 a 12% do peso entregue no lagar.

A autora e o blogue
Entre Santarém e a serra da Lousã, Marta Ribeiro não tem muita rede. É por isso que, apesar de manter o blogue Quimaterapia desde 2007, não é uma blogger, digamos, muito assídua. O que lhe ocupa as horas é a horta por regar. É aquele pedaço de madeira ou o tecido velho que encontrou. É ver as minhocas com o filho Gaspar, ir com ele e com o marido Joaquim tomar o primeiro banho de mar ou de rio. Mãe, jornalista, artesã, fotógrafa curiosa, Marta vive a mais de 65 km de Lisboa e adora. (Ah, e Quimaterapia não tem nada a ver com doenças. São apenas as terapias do Quim e da Marta).

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Por Marta Ribeiro / Quimaterapia

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