por Eva Marcela
A aldeia preservada de Quintandona, em Lagares, Penafiel, recupera a ruralidade através de atividades culturais e da arte de bem receber.
Se há lugar comum que estimo é dizer que as pessoas fazem a diferença. A minha passagem pela aldeia de Quintandona podia ter sido diferente se não tivesse a Catarina Mesquita a fazer o acolhimento. Encontramo-nos à entrada da aldeia, junto ao cruzeiro e à pequena capela particular.
Quintandona foi recuperada em 2005 com fundos europeus e o contributo dos seus habitantes. Procedeu-se à reabilitação dos espaços públicos, saneamento e rede elétrica. Com uma conversa descontraída mas que percebo vir do coração, seguimos por caminhos estreitos entre casas de xisto.
Peço-lhe para parar junto de um canastro. Sempre conheci os locais para armazenar milho como espigueiros mas aqui são um pouco diferentes: maiores, com dois compartimentos para guardar os cereais e um corredor ao centro. Assentam em quadros pilares de granito, cada um com uma laje, de modo a impedir a subida dos ratos.
Contei pelo menos quatro canastros na aldeia de Quintandona, que noutros tempos tinha como principais atividades a agricultura e engorda de gado. Hoje ainda há quem o faça mas em menor número. O lavadouro público, além de local de sociabilização, é também usado no sistema de partilha da água para regar os campos.
Quintandona não é uma aldeia museu. Aqui habitam cerca de 60 pessoas de várias faixas etárias. Apesar de grande parte do espaço estar recuperado, ainda há projetos em aberto. A Casa do Amásio pretende ser uma quinta rural pedagógica com produção agrícola mas também um lugar de acolhimento para residências artísticas.
A Casa do Aguieiro está vocacionada para turismo de habitação, com dois quartos, casa de banho, sala e cozinha. Pode ser alugada para uns dias de descanso num lugar tranquilo.
Tento perceber a estrutura destas casas de granito amarelo e xisto, proveniente da Serra de Santo António. No rés do chão fica a cozinha enquanto o primeiro andar está reservado às áreas mais privadas. No exterior há o tradicional quinteiro (pátio), zona para animais e os muro que delimitam o espaço. Quase todas as casas têm pequenas janelas no piso térreo.
O Wine Bar – Casa da Viúva está localizado num antigo palheiro, totalmente recuperado e inaugurado em 2013. Os três pisos, com um pé direito não muito alto, estão decorados com objetos antigos que fazem perdurar a memória de outros tempos: há um rádio, garrafões de vidro transformados em candeeiros, chaves e rolhas que os amigos assinam e colocam por cima do balcão. Sob a madeira que sustenta o telhado recuperado pode-se ver alguma da telha original. Na esplanada há vários pipos com garrafas coloridas e algumas panelas de ferro, aqui conhecidas como panelas de três pernas.
A antiga casa do senhor Xiné foi adquirida pela Junta de Freguesia de Lagares e é agora o centro cultural de promoção e desenvolvimento de Quintandona. A sala de espetáculos foi inaugurada em 2012, sede do grupo de teatro local ComoDEantes que recria as vivências, lendas e tradições do povo com recurso a máscaras. Na Casa do Xiné desenvolvem-se várias atividades culturais, que passam pelo teatro, música, exposições e lançamento de livros.
Concluo a minha visita na Casa Valxisto – Country House, um espaço de turismo rural onde é possível desfrutar da natureza, gastronomia e história num ambiente moderno que não perdeu a sua essência.
A aldeia preservada de Quintandona é um verdadeiro caso de sucesso. Recuperada, cuidada e dinâmica, soube manter o traço original, atrair visitantes (receções de grupos, Festa do Caldo, atividades culturais), integrando sempre os seus habitantes na partilha do saber e tradições.
A autora e o blogue
Eva Marcela é documentalista de formação e viajante de coração. Iniciou o blogue em 2012 onde partilha os lugares que visita. Nunca sai sem um caderno de capa dura e várias canetas. Recebeu o prémio de melhor blogue de viagens pessoal na 1ª edição dos BTL Blogger Travel Awards 2014.
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