O Ecomuseu Municipal do Seixal integra oito sítios (cinco núcleos museológicos e três extensões) e gere três embarcações tradicionais de recreio. Os núcleos são sítios ou espaços de propriedade e tutela municipais, musealizados ou com aproveitamento museológico atual ou programado. As extensões são sítios ou patrimónios integrados em espaços de tutelas mistas, com parcial aproveitamento museológico.
São os seguintes: Núcleo da Mundet, Núcleo Naval, Quinta da Trindade, Olaria Romana, Moinho de Maré de Corroios, Fábrica de Pólvora, Quinta de S. Pedro, Tipografia Popular, Embarcações tradicionais.
O EMS tem por missão investigar, conservar, documentar, interpretar, valorizar e difundir testemunhos do Homem e do meio, reportados ao território e à população do concelho, com vista a contribuir para a construção e a transmissão das memórias sociais e para um desenvolvimento local sustentável.
Entre traineiras, marés e artes gráficas
Composto por cinco núcleos, três extensões e duas embarcações, o Ecomuseu Municipal do Seixal distribui-se por vários locais do concelho, desde a zona histórica ao sapal, passando pelo Tejo. Cada um retrata uma temática própria, como o passado industrial ou a importância do rio, e juntos formam uma espécie de puzzle que agrega a identidade da cidade. Quem disse que o saber não ocupa lugar? No Seixal ocupa, pelo menos, 10 lugares.
Há mais de 30 anos que o Ecomuseu Municipal do Seixal conta a história do concelho. Criado em 1982, ganhou o estatuto de ecomuseu um ano depois graças a uma estratégia que privilegia a relação entre o território, o património e a população (em contraste com os museus tradicionais, assentes num único edifício e virados para um público mais erudito) ou seja, descentralizando-se e envolvendo-se com as comunidades locais. Ao longo dos anos foi crescendo em número e estendendo-se pelo território e hoje conta já com 10 espaços.
Destes, a maioria (cinco) são núcleos museológicos: o Núcleo da Mundet, que integra uma antiga fábrica corticeira; o Núcleo Naval, situado na Arrentela; o Núcleo do Moinho de Maré de Corroios, dedicado à moagem tradicional; o Núcleo da Quinta da Trindade, propriedade que remonta ao século XV; e o Núcleo da Olaria Romana, sítio arqueológico com origens no século II e único Monumento Nacional do concelho. A estes juntam-se três extensões: Espaço Memória – Tipografia Popular do Seixal, sobre a história das artes gráficas; Quinta de São Pedro, antiga propriedade senhorial onde foi encontrada uma necrópole; e a Fábrica de Pólvora de Vale de Milhaços, que dá a conhecer o circuito de produção da pólvora negra. O acervo do Ecomuseu fica completo com duas embarcações, normalmente utilizadas entre a primavera e o outono para passeios no Tejo: o bote-de-fragata Baía do Seixal e o varino Amoroso.
Entre tantos locais, é quase impossível conhecê-los todos num só dia (até porque alguns têm o acesso condicionado) por isso escolhemos três - Núcleo Naval, Moinho de Maré e Tipografia Popular - que são uma boa amostra da oferta museológica municipal, tão diversificada quanto surpreendente. Venha daí conhecê-los.
Navegando entre memórias
A nossa visita começa à beira Tejo, pelo Núcleo Naval da Arrentela, onde no século passado existiu um antigo estaleiro, desativado nos anos 70. Hoje, este local evoca a importância que os barcos e a construção naval tiveram para estas zona, evocando-os numa exposição que junta fotografias, elementos multimédia, uma maqueta (do antigo estaleiro) e vários modelos feitos à escala. Entre eles destaca-se uma muleta, embarcação de pesca já desaparecida mas que outrora teve grande protagonismo na região, a ponto de estar representada no brasão de armas do Seixal.
Curioso é também comparar o modelo da fragata Cravidão com os restos da original que jaz lá fora (foi incendiada várias vezes) já que uma janela estrategicamente colocada permite observar as duas ao mesmo tempo. Melhor mesmo só subindo a bordo de uma das embarcações restauradas pela autarquia, agora utilizadas para passeios, cujas fotos também estão expostas neste núcleo.
Noutra sala deste núcleo existe uma oficina, onde é possível conhecer o trabalho de um artífice da autarquia, o sr. Fernando Dâmaso, que aqui constrói, mantém e repara os modelos das embarcações tradicionais. Se passar por lá, aproveite para dois dedos de conversa com ele e conheça melhor os utensílios e as técnicas utilizadas na construção destes pequenos barcos que, em alguns casos, pode demorar quase um ano.
As marés e os biscoitos dos marinheiros
Segue-se uma viagem até ao lado oposto da baía do Seixal para conhecer o Núcleo do Moinho de Maré de Corroios, um dos mais antigos entre os 45 que existem no Estuário do Tejo. Construído em 1403 e em laboração até à década de 80 do século passado, soube aproveitar as características próprias desta zona de sapal, recorrendo à energia das marés para fazer andar cada uma das oito mós que existem no interior do edifício.
junto a elas, os visitantes ficam a conhecer todo o processo de moagem dos cereais e descobrem algumas curiosidades sobre a história deste local. Por exemplo, durante longos anos ajudou a abastecer a capital de farinha e, inclusive, os fornos reais que produziam o biscoito comido pelos marinheiros portugueses na época dos Descobrimentos. No piso térreo encontramos também uma exposição de longa duração – 600 anos de Moagem no Moinho de Maré de Corroios -, enquanto no primeiro piso existe uma maquete deste moinho, um auditório e um espaço para atividades.
O moinho, por si só, já justifica a visita mas a paisagem envolvente também merece um olhar mais atento. Afinal trata-se de um espaço natural protegido (zona REN, Rede Ecológica Nacional) e da mais importante área húmida de um concelho fortemente urbanizado. Se tiver oportunidade, não deixe de conhecer este local em alturas diferentes do dia para observar como a paisagem se transfigura consoante os dois ciclos diários da maré. E enquanto esta sobe e desce, você inspira e expira tranquilidade.
Memórias de um tipógrafo
O nosso roteiro pelo Ecomuseu termina no coração da zona histórica do Seixal, onde fica a extensão da Tipografia Popular, aberta ao público em 2011. Além de manter as instalações da antiga Tipografia Popular A. Palaio (funcionou durante cinco décadas, desde 1955 até 2006), este espaço também resgata todos os dias as memórias de um dos seus antigos proprietários, o sr. Eduardo Palaio. Ele próprio encarrega-se de mostrar o espaço a quem o visita e de demonstrar o funcionamento de todos os equipamentos, com uma paixão e disponibilidade impares. Haverá museu mais vivo que este?
Aqui ficamos a conhecer a história das artes gráficas tradicionais, bem como as antigas técnicas de composição manual e de impressão, sem esquecer as principais máquinas, como destaque para as Minerva. Numa delas, os visitantes são convidados a pôr-se na pele de um minervista (o funcionário que as operava) e a imprimirem um folheto que, depois, poderão levar para casa. Do espólio destaca-se também a guilhetina Foundry, construída na Alemanha há 100 anos e que é já uma raridade, ou não restasse apenas uma dezena (a funcionar) em todo no mundo.
Já as paredes estão cheias com reproduções de gravuras alusivas às as artes gráficas como uma do século XV que representa o diálogo entre a morte e os tipógrafos e livreiros, encarados como uma ameaça para a igreja da época. A dois passos dali, uma frase ainda mais antiga, redigida no século XVIII por um abade, dá o mote para o espírito deste local: “Mais do que cavar a videira, bom é escrever livros; lá trabalha-se para a venda, aqui para a alma!”. E o mesmo acontece na Tipografia Popular do Seixal. Vale a pena passar por lá e, já agora, pelos outros espaços do Ecomuseu. A solo ou em conjunto prometem experiências que ficam gravadas na memória.
Veja também a foto reportagem sobre o Ecomuseu Municipal do Seixal.