Serra não é só a Estrela. O blogue Contramapa, em estreia no Lifecooler, corre a serra de São Mamede, no Alto Alentejo, de fio a pavio. Marvão e Castelo de Vide, cada uma à sua maneira, são vilas que o visitante não deve perder.
Há um par de semanas fui passar o fim-de-semana à serra de São Mamede. A desculpa foi o 24 Horas Todo-o-Terreno, em Fronteira, mas já há algum tempo que queria visitar o Marvão e Castelo de Vide. Conheço bem o sul do Alentejo – a minha família é de lá – mas nunca tinha visitado o norte do Alentejo, e tinha curiosidade. Ficámos apenas um fim-de-semana, mas teria ficado uma semana inteira por lá. Acreditam, há muito que fazer. E que comer. Ora vejam…
Ao final de sábado, entrámos pelo Parque Natural da Serra de São Mamede adentro. Portalegre dá as boas-vindas a esta natureza, que ocupa 31 mil hectares do Alentejo. Com relevo suave e ondulado, a serra vem destoar com as grandes planícies do Baixo Alentejo, com um pico a 1025 metros de altitude.
A vila de Marvão
A nossa primeira paragem foi Marvão. E é um dos sítios mais bonitos de Portugal, esta vila. Chegamos já de noite e gostámos tanto que voltámos na manhã do dia seguinte.
A pequena vila-museu ficou parada no tempo e foi mais tarde conservada e recuperada. Quando, durante a manhã, subimos ao castelo, compreendemos a importância que esta terra teve de ter no passado.
A zona é habitada deste a época dos romanos, e foi fundada pelo islâmico Ibn Marwan al-Yil’liqui no século IX. Foi um ponto crítico na Reconquista portuguesa, sendo que D. Afonso Henriques a conquistou no século XII e, no século seguinte, D. Sancho a reconquistou de novo aos mouros.
Depois da Reconquista, rapidamente o castelo se transformou numa fortificação importante, de defesa contra os castelhanos. É verdade, do topo do castelo de Marvão, quase que vemos a Estremadura espanhola.
A vila de Castelo de Vide
Arrancámos do Marvão à hora de almoço e, da parte da tarde, fomos visitar Castelo de Vide. Apenas a 10km de distância, esta vila é bastante diferente. Menos vila-museu que Marvão, não tem muitos mais habitantes, mas tem mais vida.
No centro histórico, encontra-se o burgo medieval dentro das muralhas. Neste lugar mágico de casas baixas e ruas estreitas e tortas, sentimos que viajamos ao século XVI. E a exposição acerca das técnicas de tortura da Inquisição portuguesa que encontrámos dentro do castelo apenas acentuou este efeito (sim, é macabro, mas fiquem descansados se passarem por lá: provavelmente, é uma exposição temporária).
Dentro do burgo medieval, existe a Judiaria, que é, talvez, o bairro judeu mais bem conservado em Portugal. Se passarem por aqui, não deixem de visitar a sinagoga, a fonte da Vila, a Rua da Judiaria e a Rua Nova. Aqui, a maioria das portas mantém o arco gótico ogival e em muitas ombreiras, do lado direito, podemos ver fendas esculpidas. São marcas do povo judaico: os mezuzot, onde os judeus guardavam pergaminhos com a sua profissão de fé.
O que visitar no Marvão e Castelo de Vide
Ora bem, apenas estive um dia entre estas duas vilas amorosas, a percorrer as ruas e a subir aos castelos. Mas vão facilmente descobrir que se poderá passar mais de uma semana entre estas duas povoações, no coração do Parque Natural da Serra de São Mamede:
• Castelo de Marvão. Com entrada livre entre Novembro e Março, custa apenas 1,30 euros no resto do ano. Existem também visitas guiadas de 45 minutos diariamente, por 5 euros.
• Percorrer as ruas da vila de Marvão. Procurem pela Capela do Calvário, Pelourinho e pela Igreja do Espírito Santo.
• Cidade Romana de Anmaia. As ruínas estiveram abandonadas até 1994, mas , hoje, são cuidadas pela Fundação Anmaia, que gere um museu arqueológico no local, a poucos quilómetros do Marvão. O projeto de recuperação iniciou-se em 2009, com fundos da Fundação Calouste Gulbenkian.
• Ponte Quinhentista. Sobre o rio Sever e perto da cidade romana de Anmaia, ergue-se a ponte do século XVI, construída com a utilização de pedras de ruínas romanas.
• Castelo e Burgo Medieval de Castelo de Vide. Percorrer as ruas da vila e subir ao castelo é absolutamente obrigatório.
• Judiaria de Castelo de Vide. Não deixem de passear pelas ruas da Judiaria, entrar na antiga sinagoga transformada em museu, e passar pela fonte da vila. Vejam aqui este mapa interativo que vos mostra os principais pontos da vila.
Onde comer
Alter do Chão – Restaurante Pátio Real
A caminho da serra de São Mamede fizemos uma paragem estratégica em Alter do Chão, a 30 km do Marvão. Uma paragem gastronómica, claro. No centro da vila, fomos ao restaurante Pátio Real e, como o nome indica, fizemos a nossa refeição no jardim do restaurante.
Aproveitámos a primeira paragem para saborear uma das iguarias a zona: a sopa de sarrapatel. Basicamente, é uma sopa feita com o sangue e os miúdos do borrego. Como é um prato típico da zona, fiz questão de experimentar. Uma pessoa não pode morrer burra. Mas admito que não fiquei muito fã. Veio com uma rodela de laranja, mas mesmo assim era demasiado forte para mim.
O segundo prato foi bem mais simpático. Migas com borrego. E um dos melhores borregos que já comi.
Fica na Av. Dr. João Pestana 37, no centro de Castelo de Vide. A especialidade da casa é oarroz de açafrão.
Marvão - Restaurante Varanda do Alentejo
Com uma vista para a serra de São Mamede das janelas do primeiro andar, a Varanda do Alentejo encanta também pelo estômago. Voltámos à gastronomia tradicional, como não podia deixar de ser. Desta vez, açorda, sopa de tomate e entrecosto com migas. A açorda não era a mais tradicional, já que era bastante espessa e carregada de coentros. A sopa de tomate estava também muito intensa, mas gostei menos e não consegui terminar. Já o entrecosto com migas, 5 estrelas! Fica na Praça do Pelourinho, no centro do Marvão. Encontrem um lugar junto à janela, para apreciarem a panorâmica.
Castelo de Vide – Restaurante Confraria
Na Confraria encontrámos um espaço pequeno e acolhedor, principalmente pelo dono do restaurante que fez questão de nos recomendar o que de melhor havia. E de nos dar dois dedos de conversa. Ou três. Ou quatro.
A comida, essa, não podia ser mais caseira, feita pela própria esposa. Não resistimos de novo à açorda, desta vez bem mais tradicional e líquida. Depois, escolhemos dois pratos de caça:lebre com feijão branco e escabeche de perdiz com batata assada.
Devo dizer que estava tudo D-I-V-I-N-A-L e a Confraria ganhou o prémio da comidinha do fim-de-semana. Sim, gostei tanto, que tive de pedir para repetir o escabeche de perdiz…
Fica na Na Rua de Santa Maria de Baixo, em Castelo de Vide. Se quiserem provar um pouco de tudo, não se esqueçam de perguntar pelo menu de degustação.
Castelo de Vide – Toca do Chocolate
A poucos metros da Confraria, existe o local ideal para a sobremesa: uma chocolateria. Claro que não conseguirmos resistir! O espaço é muito acolhedor e com uma grande variedade. Ficámo-nos por uns lábios de chocolate e uma trufa, mas bem que podíamos ter comido a loja inteira.
Gastronomia na Serra de São Mamede
Não conseguimos provar todas as iguarias num fim-de-semana, mas fica aqui uma listagem daquilo que há de mais caraterístico na zona:
• Sopa de sarrapatel
• Açorda alentejana
• Migas com Entrecosto / Borrego
• Pratos de Caça: perdiz, lebre
• Arroz de açafrão com borrego
• Ensopado de Borrego
• Alhada de Cação
• Pezinhos de Coentrada
• Molhinhos em Tomatada
• Fígado à Moda de Castelo de Vide
• Chibo de Cachafrito
Onde dormir :
Existem muitas opções de alojamento rural na serra de São Mamede e no Marvão. Nós optámos por ficar na TrainSpot Guesthouse e não poderíamos ter feito uma melhor escolha.
Localizado na aldeia de Beirã, a hospedagem foi construída na antiga estação de comboios da aldeia. Chegámos e a lareira estava acesa no salão principal, ao som de JP Simões. Fiquei logo encantada. A varanda principal dá para a linha de comboios abandonada, os os azulejos e as placas se mantêm. Com sofás acolhedores e uma cozinha para os hóspedes, o espaço tem pormenores encantadores.
É engraçado. Normalmente, não dou muito valor ao local onde fico alojada. Acho que é sempre um sítio para dormir e seguir caminho. Mas no TrainSpot senti-me tentada a ficar um semana, a ler, a aquecer os pés na lareira e a sonhar com um tempo em que os comboios passavam ali…
Apesar dos quartos não terem a comodidade que se espera num hotel de 4 ou 5 estrelas (os quartos eram pequenos e com pouca mobília, e nós escolhemos ter casa-de-banho partilhada), esta guesthouse tem qualquer coisa que outros alojamentos de topo onde já fiquei não têm, e que me fez querer ficar. Caráter. Nós ficámos num quarto duplo com casa-de-banho partilhada, que nos custou 40 euros. Mas existem também quartos com casa-de-banho privativa e apartamentos.
A autora e o blogue
Diana Guerra fez o primeiro passaporte em Março de 2008 porque nesse mesmo mês tinha viagem marcada para Marrocos. Estava no segundo ano de faculdade e, até à altura, tinha viajado muito pouco e sempre dentro da Europa. Tomou-lhe o gosto e desde aí tem continuado, nas horas vagas, a explorar novos mundos. Quis ser jornalista desde que se lembra, sempre adorou ler e contar histórias através da escrita. Quando mal sabia ler e escrever, já fazia recortes e colagens de jornais, mas quis a vida que rumasse para Gestão e abandonasse a escrita. Pôs o papel e a caneta de lado, e abraçou o mundo empresarial e os ficheiros de Excel porque, afinal, os números, as contas e a lógica também a fascinam. Mas os bichinhos da escrita e das viagens são teimosos e, de vez em quando, teimam em reaparecer e foi por isso que surgiu o Contramapa: para dar voz a esses monstrinhos.
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