Apaixonada pela cultura romana, Eva Marcela, do blogue Documentar o Mundo, levou algum tempo a conhecer o Museu de Odrinhas. Não foi à terceira mas sim à quarta vez que lá entrou. Calhou bem, era dia de romaria na ermida vizinha.
A primeira vez que ouvi falar do Museu das Odrinhas foi nas comemorações do Dia Internacional da Arqueologia. “Um museu arqueológico em Sintra e eu não conheço?” pensei. Claro que há sempre escolhas e esse não foi o ano em que o visitei. Alguns meses depois, numa ronda de geocaching pela zona, parei à porta, mas como estava encerrado segui o meu caminho. Passei uma terceira vez quando me dirigia para o Museu do Ar mas foi durante uma romaria local que finalmente o conheci. É que este museu tem uma particularidade: está inserido num ambiente rural. Tal facto não lhe tira qualquer mérito e as minhas expectativas iam altas, não só pelos sucessivos adiamentos mas porque sou uma apaixonada pela cultura romana.
Passando o átrio, entrei na cripta etrusca. A meia luz, as pequenas dimensões e o ambiente silencioso lembraram-me o lugar mais recôndito dos templos egípcios mas sem as centenas de pessoas a acotovelarem-se. Um dos sarcófagos etruscos é imponente, exibindo na tampa uma figura humana deitada.
Saí de um ambiente intimista para uma sala inundada de luz. É a basílica romana e a dimensão teve um grande impacto. São dezenas de lápides de homens, mulheres e escravos, todas provenientes da região. No topo, como que a recriar uma capela mor, há um conjunto de aras dentro de nichos. Andei a vaguear por entre os corredores, tentando decifrar algumas inscrições e recordar o meu latim.
Tal como aconteceu em tantos outros lugares, também em Sintra se reutilizaram estes vestígios romanos no quotidiano das pessoas. Na sala cronos devorator há túmulos romanos que deram lugar a vasos, salgadeiras, pias de azeite, locais para amassar o pão e até uma pia batismal.
E de repente atravesso quatro séculos ao subir a rampa da necrópole medieval com as suas sepulturas, tampas e cabeceiras que ocupam as paredes.
Como tudo tem um fim, é no fines que termino a visita, com os marcos de fronteira que separavam Lisboa e Sintra.
Saí da frescura das pedras para a cegueira de um sol quente. Era caso para dizer que a procissão já ia no adro da Ermida de São Miguel de Odrinhas. Houve direito a foguetes, banda, andores decorados e cestos com oferendas. Eu via passar o santo lá no alto, perante um espetáculo barroco de emoções e muita fé.
Afastei-me para regressar às ruínas da villa romana, das quais pouco resta. Talvez com uma explicação adicional encontrasse um sentido para estas pedras mas assim acho-as simplesmente abandonadas, à mercê das ervas daninhas. O desenho e paleta cromática dos mosaicos lembrou-me as ruínas romanas de Torres Novas. Avita e Cardilio também podiam ter sido aqui felizes.
A autora e o blogue
Eva Marcela é documentalista de formação e viajante de coração. Iniciou o blogue em 2012 onde partilha os lugares que visita. Nunca sai sem um caderno de capa dura e várias canetas. Recebeu o prémio de melhor blogue de viagens pessoal na 1ª edição dos BTL Blogger Travel Awards 2014.
Blogue
Facebook
Textos anteriores no Lifecooler:
Hambúrgueres com vista para o Tejo
Há vida na aldeia de Quintandona
Por Eva Marcela 2015-05-13