O feitiço das pedras
"A grande importância (...) do complexo rupestre do Côa advém, não tanto, da densidade (...) de rochas gravadas (...) mas do extenso filo temporal que, de maneira inédita, associa num mesmo espaço representações paleolíticas e pós-glaciares". Nelson Rebanda, arqueólogo
Vale a pena não construir uma barragem para preservar vestígios arqueológicos? A pergunta pode ter as mais diversas respostas e, quando se trata de Foz Côa, ainda hoje divide as opiniões. Mas quem desça às margens do rio, se deixe envolver pela beleza do lugar e observe a delicadeza e a sofisticação dos desenhos marcados no xisto, dificilmente achará que aquele lugar não merecia ser salvaguardado. Como, de resto, a UNESCO viria a fazer, ao classificar as gravuras como Património da Humanidade.
É o maior conjunto de arte rupestre ao ar livre de toda a Europa. A sua descoberta levou os arqueólogos a repensar algumas ideias que se julgavam assentes acerca da forma como os nossos antepessados viviam, se deslocavam, abrigavam e, sobretudo, imaginavam e representavam o mundo.
Os desenhos rasgados no xisto desde há 28.000 anos são surpreendentes pelo movimento que procuram representar e pela quantidade e diversidade de animais representados, alguns dos quais já extintos. É um dia bem passado junto às margens do Côa e, a partir de agora, com o aliciante de poder visitar o novíssimo museu dedicado às gravuras rupestres.
CURIOSIDADES
Descoberta – As gravuras paleolíticas de Foz Côa foram descobertas em 1991 pelo arqueólogo do IPPAR Nelson Rebanda. Depressa se descobriu que os desenhos se distribuíam ao longo de uma faixa de 17 km do curso do rio Côa. A decisão de suspender as obras da barragem foi tomada pelo primeiro-ministro António Guterres em finais de 1995 e a UNESCO classificou as gravuras em 1998.
Cavalinho – Provando que as representações rupestres ao ar livre correspondem a um território alargado que se estende até Siega Verde (Espanha), em 1981 já havia sido descoberto um conjunto de gravuras junto à aldeia transmontana de Mazouco (Freixo-de-Espada-à-Cinta). Trata-se de um conjunto de desenhos, numa fraga junto ao rio Douro, dos quais o mais bem conservado representa um cavalo em movimento. Grande atracção local, ficou conhecida como Cavalinho de Mazouco.
30.000 anos de história – As gravuras até hoje inventariadas abrangem um longo período: desde 28.000 a.C. até 8.000 a.C. (desenhos do paleolítico representando auroques, cabras e cavalos selvagens), entre 5.500 e 2.000 a. C. (representações do neolítico e do calcolítico de bandos de veados e homens) e de 1.000 a.C. (neste caso com figurações da Idade do Ferro mostrando cavaleiros com lanças). Há, ainda, perto da abandonada barragem, desenhos mais recentes, do século XVIII a meados do século XX, com motivos populares.
INFORMAÇÕES
As visitas aos três núcleos abertos ao público (Penascosa, Canada do Inferno e Muxagata) só são possíveis mediante marcação prévia junto dos serviços do Parque Arqueológico do Côa. Algumas podem ser efectuadas de noite, altura ideal para observar detalhadamente alguns dos desenhos mais intrincados.
Parque Arqueológico do Vale do Côa
Tel. 271 768 260
http://www.arte-coa.pt
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