A rainha da festa
«Cada indivíduo, munido já do seu pão, compra cinco ou seis sardinhas fritas ou assadas pelo preço de um soldo, ou dezoito dinheiros, e ali mesmo come, ficando jantado». Joseph Carrére, médico francês; Panorama de Lisboa no Ano de 1796.
Tempos houve em que a sardinha era o único peixe que chegava ao interior do país. Era fácil de conservar em sal e assim viajava, de burro ou de carroça, até às mais remotas aldeias. Uma melhor rede de estradas e um outro nível de vida, que passou pela democratização do frigorífico, acabaram com a exlusividade sardinhística.
Porém, não acabou aqui o seu reinado. A sardinha passou a ficar reservada para as ocasiões festivas, assada ao ar livre e tirada da grelha mal apura. Para o prato? Nem pensar. Para o pão, que vai ensopando do molho de sucessivos peixes. A única ferramenta requerida é uma navalha, para a abrir ao meio, afastar as espinhas maiores e extrair a tripa do dorso que a torna indigesta. Tudo o resto se come, deixando nas mãos um inconfundível cheiro que resiste a todas as lavagens, menos às feitas com vinho tinto ou pasta de dentes.
Onde mais a encontrar, para além das festas como o Santo António de Lisboa? Em qualquer terra de pescadores, de Portimão a Sesimbra, de Peniche a Matosinhos.
CURIOSIDADES
Tradição secular – Abundante na costa portuguesa, a sardinha faz, há séculos, parte da alimentação popular. Em Lisboa, no século XVIII multiplicavam-se os assadores na rua. Os visitantes estrangeiros espantavam-se tanto. com este sistema precursor do «fast-food», como se horrorizavam com os cheiros e barulhos que reinavam à volta. É o caso da conhecida descrição, publicada, em 1796, pelo francês Carrére. «Uma fumarada gordurosa, com mau cheiro, densa, vai saindo lentamente de uma porta, vai saindo até tapar a vista de uma parte do edifício em frente do qual se enovela e se espalha. Defronte, um grupo numeroso de pessoas de ambos os sexos atravanca a passagem em grande agitação e movimento: ouve-se gritos, que aqui e além se cruzam». Pitoresco, não? O pior era aquilo a que hoje chamaríamos os danos colaterais. «Se para o povo estes estabelecimentos constituem uma grande comodidade, a sua multiplicação, para os que têm a desgraça de lhes serem vizinhos, tem muitos inconvenientes; incomodados como são pelo fumo, pelo cheiro, três vezes por dia aturdidos com o barulho ensurdecedor da multidão que os procura».
Cerco aos cardumes – Se as sardinhas são peixes relativamente pequenos, andando pelos 15 cm de comprimento, formam grandes cardumes no mar. Primeiro a remos e à vela e, nos nossos dias, a motor, os pescadores desenvolveram a arte do cerco para capturar estes peixes, através de redes muito extensas.
Conservas em crise – As fábricas de conserva (sardinha e atum), outrora um esteio da indústria agro-alimentar portuguesa, perderam expressão e muitas das antigas instalações foram reconvertidas para outros fins, incluindo estabelecimentos de diversão nocturna, como acontece em Matosinhos.
Festivais – Nos meses de Verão, sobretudo no Algarve, sucedem-se os Festivais da Sardinha, sendo os mais conhecidos os de Portimão, Faro e Loulé.
INFORMAÇÕES
À Descoberta da Sardinha Assada no Século XVIII
http://passadocurioso.blogspot.com/2005/11/descoberta-da-sardinha-assada-no-sc.html
Festivais de sardinha
Região de Turismo do Algarve
www.rtalgarve.pt
www.visitalgarve.pt