Destilado genial
“Velha tendinha / És o templo da pinguinha / Dos dois brancos, da ginjinha / Da boémia e do pimpão”.
Amália Rodrigues, no fado «Tendinha»
Quimicamente falando, é o produto da destilação da ginja fermentada. Mas quem quer saber da arte de Lavoisier quando lhe deitam no cálice esta bebida alcoólica, açucarada e de textura inconfundível?
Há quem a prefira «com elas», ou seja com fruta macerada, tirada do fundo da garrafa. Outros, parecem não querer nada «com elas» e preferem beber sem indesejadas companhias femininas . Numa versão ou noutra, é das bebidas com mais presença num certo imaginário português. Amália Rodrigues e Hermínia Silva cantaram-na no fado. António Silva brinda com ginjinha ao noivado da filha, no filme português «O Leão da Estrela». E uma volta pela noite de Lisboa não será nada se não começar com uma ginjinha bebida no Rossio.
Mas a ginjinha que já os romanos pareciam apreciar, tem um longo percurso pela história. Os frades de Alcobaça desempenharam um papel destacado com os seus licores de frutos. Hoje, tanto esta cidade como a não muito distante Óbidos, rivalizam no culto desta bebida original.
CURIOSIDADES
História milenar – A ginjinha, ou a fruta a partir da qual é produzida, parecem ser tão velhas como o mundo. No quadro “Repouso na Fuga para o Egipto”, Baltazar Gomes Figueira, mostra a Sagrada Família escondendo-se dos perseguidores, enquanto o Menino Jesus oferece a São José um ramo de ginjeira. Os romanos apreciavam a ginja, quer pelas suas capacidades diuréticas, quer pelo seu sabor agridoce. Os tratados de medicina antigos mandavam beber caroço de ginja com vinho para desfazer as pedras dos rins e matar as lombrigas. Os monges de Cister utilizaram a ginja do Couto de Alcobaça como base dos seus mais famosos licores.
Expressões relacionadas – Tão inspiradora de provérbios e ditos populares como a ginja, só o milho. Se a expressão «bom como o milho», sobretudo no feminino, é um dos mais conhecidos piropos lusos, já «que nem ginjas» é sinónimo de facilidade, sucesso garantido ou satisfação. Quando se fala em conhecer alguém «de ginjeira» a conotação é menos positiva, pois pode estar-se em presença de um malandro sobejamente falado. E se os portugueses, como metáfora do requinte máximo, colocam «a cereja em cima do bolo» os vizinhos espanhóis fazem o mesmo mas com a ginja.
Ajuda preciosa – Num mundo onde parece pairar a ameaça da extinção sobre tudo o que é bom, a ginjinha não escapa à regra. Para garantir que a matéria-prima nunca venha a faltar, as Câmaras de Óbidos e de Alcobaça associaram-se para promover a plantação de ginjais nos respectivos concelhos. Sábia decisão!
Cuidado com o fígado – Se em Lisboa alguns fiscalizadores iam pondo em causa a forma tradicional de servir a ginjinha – em cálices de vidro não necessariamente muito limpos – em Óbidos descobriu-se uma solução genial para tornear os ímpetos da ASAE: servir a bebida em copos de chocolate, cujo destino final não é, exactamente, o lava-loiças. O que vale é que que as termas das Caldas são perto.
INFORMAÇÕES
Sobre a história: www.frutobidos.pt
Dissertações: http://aginjinha.blogspot.com/
Sobre Óbidos e a ginjinha: www.ginjadeobiddos.com