EXPERIÊNCIA #80 - Vinho do Porto

Sol engarrafado

"E, daí a pouco, há sol engarrafado, a embebedar os quatro cantos do mundo". Miguel Torga

 

É o mais famoso dos vinhos portugueses e bebe-se em todo o mundo. Mas é, também, o enunciar de um paradoxo. É cultivado no Corgo, engarrafado no Pinhão e armazenado e exportado em Gaia. A referência ao Porto carece de lógica mas ficou para posteridade.
De uma combinação de terreno (encostas de xisto), clima, exposição solar e cepas nasce um vinho generoso sem igual. A sua produção a partir do século XVIII levou à criação da primeira região vinícola demarcada do mundo. Agora é a UNESCO a reconhecer o valor da paisagem do Douro Vinhateiro e a classificá-la como Património da Humanidade.
É um vinho cosmopolita e sofisticado. Mas tem outro sabor se saboreado à sombra de uma adega de Alijó. Ou nos cais de Vila Nova de Gaia, após a visita a uma das seculares caves da margem esquerda do Douro. Branco, Ruby ou Tawny, colheita recente ou Vintage, não há melhor para celebrar as coisas boas da vida e ajudar a esquecer as más.

CURIOSIDADES

Crónica de uma bestialidade – Que grande escritor português não dedicou algumas linhas ao mais famoso dos vinhos portugueses? Camilo Castelo Branco é, apenas, um exemplo, entre muitos. O autor de «Amor de Perdição», que não simpatizava com o Barão de Forrester, dedicou-lhe uma hilariante diatribe, onde até a morte por afogamento do infortunado comerciante é apresentada como «a vingança do Douro contra um dos seus maiores detractores». Em causa, uma confusão na impensa britânica acerca de «jeropiga» e «jerupiga». Uma simples troca de vogal bastava para que o produto adicionado pelos viticultores aos tonéis passasse, de uma inocente mistura alcoólica para o conteúdo de um clister. Escusado será dizer que os britânicos acreditaram estar perante a segunda hipótese e disso fizeram grande alarido. O suficiente para o inspirado romancista zurzir «uma bestialidade inglesa».

Sem Camões – Jaime Cortesão, impressionado pelo esforço secular que representou a construção de milhares de terraços nas encostas de xisto, disse estar-se perante «o mais belo e doloroso monumento ao trabalho do povo português». E acrescentou tratar-se «dos Lusíadas sem Camões».

Síntese genial – A mais emocionada síntese do que é o labor vinhateiro só podia pertencer a um transmontano, Miguel Torga. «Nas margens de um rio de oiro, crucificado entre o calor do céu que de cima o bebe e a sede do leito que de baixo o seca, erguem-se os muros do milagre. Em íngremes socalcos, varandins que nenhum palácio aveza, crescem as cepas como os manjericos às janelas. Em Setembro, os homens deixam as eiras da Terra Fria e descem, em rogas, a escadaria do lagar de xisto. Cantam, dançam e trabalham. Depois, sobem. E daí a pouco há sol engarrafado a embebedar os quatro cantos do mundo».

INFORMAÇÕES

Rota do Vinho do Porto:
www.rvp.pt 

Instituto do Vinho do Porto:
www.ivp.pt 

Caves do Vinho do Porto:
www.cavesvinhodoporto.com 

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