EXPERIÊNCIA #100 - Pão Alentejano

Sabor autêntico

«Por ser pão e por ser amassado com o suor do rosto, sabe a trabalho. Mas é por isso que os naturais o beijam quando ele cai no chão.» Miguel Torga

Um europeu da Idade Média conseguia sobreviver comendo, apenas, pão. Era um alimento completo, com vitaminas, gordura, fibras e poder calórico. Hoje o produto homónimo que compramos na padaria ou no supermercado mal dura um dia: na manhã seguinte tem a consistência de uma esponja e sabor a condizer.
Mas nem todo o pão é assim. O feito por processos tradicionais continua a ter grande procura e é das coisa que melhor se vende, nas feiras ou à beira da estrada: pão saloio, broa de Avintes e, sobretudo, pão alentejano... Cortado às fatias, com uma navalha, tem uma consistência e um sabor inconfundíveis, com um travo ligeiramente ácido. Dizem os entendidos que isso resulta do processo tradicional de fermentação, mais lento.
É o companheiro ideal do paio, do queijo, da azeitona e da caneca de tinto, na hora do petisco. E, quando envelhece, nem por isso fica imprestável: como seriam feitas as açordas e migas alentejans senão com pão deste, amassado e demolhado em água?

CURIOSIDADES

Sabor característico – Também chamado Pão de Cabeça, o pão alentejano é feito com farinha de trigo e isco puro, pelo método ancestral da fermentação lenta. Daqui resultam as suas carcterísticas primordiais: espessura, sabor e travo levemente ácido.

Tríade de sabores – Zona tradicionalmente pobre, o Alentejo baseia a sua cozinha em três produtos bíblicos: o pão, o azeite e o vinho. Se os dois últimos já estão protegidos legalmente, falta o reconhecimento do primeiro como produto genuíno.

Cozinhar com pão – Pode fazer-se tudo com este pão e não apenas comê-lo à fatia. Combinado com outros ingredientes é a base de muitos dos mais famosos pratos alentejanos, desde os ensopados, às migas, sem esquecer a saborosa sopa de tomate. Água a ferver, um fio de azeite, algumas ervas, uns pedaços de queijo ou de enchidos e aí está o milagre alquímico da cozinha da região: de ingredientes pobres fazer uma comida rica e substancial.

Pão para toda a obra – Alentejano ou não, o pão entra numa infinidade de ditados e expressões populares, o que só mostra a que ponto faz parte da herança cultural das civilizações que se foram sucedendo, desde a revolução do neolítico, 5.000 anos antes de Cristo. Comer «o pão que o diabo amassou» é sinónimo de passar tempos difíceis. «Pão, pão, queijo, queijo», equivale a ir directo ao assunto. Para significar imprescindível nada melhor que nos referirmos a algo que faz tanta falta «como o pão para a boca». Extravasando os domínios alimentares e entrando nos dialectos e calões urbanos, «um pão» tanto pode significar um murro (geralmente dirigido «ao focinho» ou «às trombas») como um rapaz desempenado, bem constituído e com probabilidades de ter sucesso junto do sexo oposto.

INFORMAÇÕES

Arranja-se no supermercado mas, se quiser juntar o útil ao agradável, porque não ir comprar o páo alentejano ao local de origem? É a oportunidade para rever a mais autêntica e menos descaracterizada região portuguesa. Duas sugestões entre muitas: os mercados semanais (como o de sábado no Rossio de Estremoz) ou as grandes feiras alentejenas, da de Castro Verde à de Grândola.

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