Do chouriço à linguiça, passando pela farinheira, morcela e cacholeira, é extensa e variada a lista de enchidos que o Alentejo dá a provar. Um sabor genuíno e já certificado que honra saberes e tradições transmitidos de geração em geração.
Eternos apreciadores da carne de porco, os alentejanos encontraram nos enchidos a possibilidade de a conservarem com facilidade, assegurando uma reserva para todo o ano. Há muito que estes produtos assumiram, então, um papel essencial, não só na alimentação, mas na própria cultura da região. Isto porque, antes mesmo de chegarem à mesa, já eles encarnaram muitos dos rituais e tradições que melhor caracterizam o Alentejo.
Em boa verdade, tudo começa no montado. É aqui, entre sobreiros e azinheiras, que os porcos são criados e alimentados com bolotas. Destes, o porco preto é a raça mais apreciada, graças às características próprias da sua carne, considerada mais tenra e saborosa. Mas são também muitos os alentejanos que gostam de criar um ou dois porcos junto a casa, dando-lhe de comer de tudo um pouco, desde couves e batatas aos próprios restos das refeições familiares.
Entre Dezembro e Fevereiro, é tempo de festa, ou seja... da matança. Convidam-se os amigos e a família (ou mesmo grande parte da aldeia) e, enquanto os homens vão buscar o animal, já as mulheres preparam um alguidar para recolher o sangue. Depois de morto o “chibo”, como se diz por lá, começam por ser retirados os miúdos e as tripas, enquanto as carnes destinadas aos enchidos ficam para depois da desmancha. Uma coisa é certa: nada é desperdiçado.
Do tempero ao fumeiro
Diz quem sabe que a qualidade da carne e o tempero são dois dos principais segredos de um bom enchido alentejano. Já a receita parece ser relativamente simples uma vez que, além da carne, pouco mais leva que massa de pimentão, sal e alho pisado. No caso da farinheira, juntam-se ainda a pimenta e a farinha de trigo, enquanto a morcela não pode passar sem o vinho e as especiarias.
É claro que cada parte do corpo (que determina o tipo de carne) tem o seu próprio destino. Por exemplo, a carne do lombo é utilizada para fazer os paios, a zona das pás destina-se aos chouriços, as pernas aos painhos e as gorduras e carnes entremeadas do peito às farinheiras.
Quase todos são enchidos em tripas naturais e atados com um fio antes de seguirem para o fumeiro, onde ficam pendurados em varas. Quem se sentou ao lume numa típica lareira alentejana já certamente deve ter reparado na quantidade de enchidos que ali “repousam”.
Nelson Jerónimo Rodrigues 2010-05-03