A tradição do bolo-rei

Uma história atribulada.

“Numa casa portuguesa fica bem…” bolo-rei e Vinho do Porto sobre a mesa, durante a época natalícia. Seria uma adaptação muito bem aceite à letra da canção original, uma vez que corresponde inteiramente à verdade.
É muito raro encontrar quem recuse uma fatia do anel de frutos – mesmo quem não aprecia os ditos, secos ou cristalizados, dá-se ao trabalho de retirá-los meticulosamente para saborear a massa pouco doce e muito macia. Mais do que uma guloseima, é um símbolo, representando os presentes oferecidos pelos Reis Magos ao Menino Jesus.

A festa de Reis começou muito cedo a ser celebrada na corte dos reis de França. O bolo-rei terá surgido no reinado de Luís XIV, para as festas do Ano Novo e do dia de Reis. Vários escritores escreveram sobre a iguaria, e Greuze celebrou-a num quadro, precisamente com o nome de Gâteau des Rois.

Por altura da Revolução Francesa, o bolo foi proibido por aludir à monarquia… mas os pasteleiros franceses rebaptizaram-no de "gâteau des sans-culottes", e lá acabou por sobreviver.

A receita foi trazida de Paris para Lisboa por Baltasar Castanheira Júnior, filho do fundador da Confeitaria Nacional, nos finais do século XIX, proeza que valeu à pastelaria da Praça da Figueira o prestígio de ter sido a fornecedora da Casa Real desde o reinado de D. Maria II até à implantação da República. Actualmente a procura do bolo-rei desta casa continua a ser avassaladora.

Acontece que a ameaça a esta confecção tradicional chegou a Portugal com a proclamação da República, mas a inspiração também veio com ela e houve, durante uns tempos, um “bolo-presidente” a ocupar lugar de honra nas pastelarias, entre Novembro e Janeiro. E que tal experimentar algo diferente, este ano, e cozinhar o seu próprio bolo-rei em casa? Tentar, não custa. Para ajudar à tarefa, deixamos aqui a receita publicada por Maria de Lourdes Modesto na sua “Cozinha Tradicional Portuguesa”.

Ingredientes:

750 g de farinha; 30 g de fermento de padeiro; 150 g de manteiga ou de margarina; 150 g de açúcar; 150 g de frutas cristalizadas; 150 g de frutos secos (pinhões, nozes, passas, etc.); 4 ovos; 1 limão; 1 laranja; 1 dl de vinho do Porto; 1 colher de sobremesa (rasa) de sal grosso.

Receita:

Picam-se as frutas cristalizadas e põem-se a macerar em Vinho do Porto, juntamente com as frutas secas. Dissolve-se o fermento em 1 dl de água tépida e junta-se a uma chávena de farinha (tirada do peso total). Mistura-se e deixa-se levedar em ambiente morno durante cerca de 15 minutos.
Entretanto, bate-se a gordura escolhida, o açúcar e a raspa das cascas do limão e da laranja. Juntam-se os ovos, um a um, batendo entre cada adição, e depois a massa de fermento. Quando tudo estiver bem ligado, adiciona-se a restante farinha peneirada com o sal. Amassa-se ou bate-se a massa muito bem. Esta massa deve ficar macia e elástica. Se estiver muito rija, junta-se um pouco de leite tépido. Misturam-se as frutas maceradas no vinho do Porto.

Volta a amassar-se e molda-se em bola. Polvilha-se a massa com um pouco de farinha, tapa-se com um pano e envolve-se a tigela num cobertor. Deixa-se levedar em ambiente morno durante cerca de 5 horas. Quando a massa estiver bem leveda - em princípio deve dobrar de volume - mexe-se e molda-se novamente em bola (ou em várias bolas) e, já sobre um tabuleiro untado, faz-se-lhe um buraco no meio. Introduz-se a fava e o brinde, este embrulhado em papel vegetal.

Deixa-se levedar durante mais 1 hora. Depois pincela-se o bolo com gema de ovo e enfeita-se com frutas cristalizadas inteiras, torrões de açúcar, pinhões inteiros, meias nozes, etc. Leva-se a cozer em forno bem quente. Para impedir que a rodela feche, pode introduzir-se uma tigela no buraco. Depois de cozido, pincela-se o bolo-rei com geleia diluída num pouco de água quente.

Ana Marta Ramos 2005-01-04

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