SALDOS: a tradição ainda é o que era

A época dos saldos está ao rubro. Já muito se vasculhou mas ainda há muito para vasculhar. Com a fina ironia a que já nos habituou, A Gaja analisa a última temporada de rebajas, tal como a conhecemos. É que para o ano tudo muda. Deixa de haver uma data oficial para o início e o fim da corrida às melhores e maiores promoções. É aproveitar enquanto há.

Diz que, em 2015, já não haverá época de saldos nas alturas costumeiras. O que é uma pena porque já não assistiremos ao ritual semestral do gasto irracional dos subsídios de Natal e férias em itens de necessidade absolutamente essencial, como dez pares de ténis, cinco casacos, duas Go Pro e edições deluxe de séries que podem ser pirateadas a custo zero.

Ainda assim, temos aí a decorrer a derradeira época de saldos outono/inverno, a última oportunidade de assistir a esse curioso ritual da natureza humana, que se pode resumir na máxima “menino não entra”.

Basta passar por uma desses talhos têxteis cujo nome não vale a pena referir para observar hordas de machos especados à porta, com semblantes que oscilam entre o aborrecido, o acostumado, o irritado e o “esta gaja está a estoirar-me o cartão e no fim do mês já não vou ter guito para ir ver o Sporting a Alvalade”.

Enquanto elas se aventuram entre exóticas cachoeiras de leggings, exuberantes florestas de camisolas, cachecóis e atoalhados, prados viçosos de acessórios vários, carteiras, malas e outros itens absolutamente essenciais, eles, muitas vezes acompanhados dos filhos varões (estes, mais precavidos, munidos de tablets e consolas quejandas para passar o tempo), aguardam, num paciente aborrecimento digno do mais concentrado monge budista.

Porque é que estes coitados aguentam este calvário? Não sei. Deve fazer parte de um qualquer compromisso conjugal que a minha fraca compreensão não me permite descortinar.

Ainda assim, do ponto de vista feminino, acho muito mais interessante e libertador que um homem se mantenha longe da guerra por uma jaqueta de pele falsa ou por uma mala com 60% de desconto do que se vá enfiar numa loja a mandar bitaites. Porque há poucas coisas mais deprimentes do que ver um desgraçado atrás da mulher/namorada, a servir de charriot com pernas, equilibrando com dificuldade nos braços um número bastante elevado de peças de roupa. Quase tão deprimente quanto as figurinhas que eles depois fazem, à porta dos provadores, a mandar bitaites a medo, quando elas saem de lá de dentro enfiadas numas calças 34 (convencidíssimas de que as 10 fatias de bolo-rei, o cabrito, os sonhos e as 20 taças de champanhe não tiveram qualquer efeito nos ponteiros da balança) e perguntam: “então, ficam-me bem?”.

Por isso… e a bem da nação… mantenham os homens fora das lojas. Vão-se os saldos, mantenha-se a tradição!

A autora e a página
"A Gaja" é uma página de entretenimento da autoria de Raquel Costa. Criada em fevereiro de 2014, tem hoje perto de 30.000 seguidores. Ela não tem papas na língua (fala de assuntos que muitos preferem ignorar) e não vai em falinhas mansas. É impiedosa, inteligente, direta. As suas dicas pretendem ajudar rapazes e raparigas a acertar agulhas.
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